De uma mãe preocupada: “Percebo que minha filha de oito anos está estressada com uma amiga da escola que não a deixa em paz: não quer que ela converse com outras meninas, liga várias vezes por dia, ameaça de acabar com a amizade se ela lhe desobedecer. Minha filha gosta dessa menina, mas não gosto de vê-la se submetendo a essas exigências. Não sei bem o que fazer, dá vontade de interferir, mas não sei como”.
O comportamento de possessividade, ciúme, desejo de exclusividade acontece basicamente por insegurança e medo de perda de quem age assim, e se expressa por mensagens de ameaça e intimidação. A pessoa que se deixa intimidar (criança, adolescente ou adulto) também sente medo da perda, de ser atacada e prejudicada de algum modo. E, muitas vezes, não consegue se desvencilhar desse relacionamento ou colocar os limites apropriados.
Ações de bullying, com seu típico padrão de repetição e desigualdade de poder, constroem relações abusivas. Envolvem não só agressões físicas mas também agressões verbais, intimidação, chantagem, ameaças. Essas ações às vezes acontecem de forma velada (não somente na sala de aula mas também no pátio, no banheiro, no transporte escolar), a ponto de não serem percebidas pela equipe escolar. E a criança atingida, com pavor de que a situação possa piorar se falar sobre isso com alguém, muitas vezes pensa que não há saída a não ser sofrer em silêncio.
Como todos nós – crianças, adolescentes e adultos – temos forças e fragilidades é importante reconhecer nossos “pontos fracos” e fortalecer a resiliência para lidar com situações difíceis sem se deixar abater por elas, cultivando a autoproteção para detectar sinais de condutas abusivas, assertividade para colocar os limites devidos (“eu vou, sim, continuar a falar com outras meninas, você não pode mandar em mim”) ou se afastar da pessoa que se comporta de modo indevido.
É claro que os relacionamentos abusivos entre crianças precisam da intervenção de adultos, tanto na família quanto na escola, por meio de recursos para modificar as interações nessas redes de relacionamentos. Por isso, os programas de prevenção ao bullying abrangem ações de sensibilização de toda a equipe escolar e das famílias, assim como o trabalho com alunos que praticam, sofrem e presenciam esses comportamentos abusivos. Os que presenciam, quando bem conscientizados, promovem uma efetiva rede de inibição desses comportamentos, mostrando que a popularidade e a liderança devem ser desenvolvidas por outros meios que não a intimidação e a dominação.
Com crianças e adolescentes enredados em relacionamentos abusivos, as perguntas reflexivas são recursos para estimular outros tipos de ação. Por exemplo: “Que outras crianças podem ser suas amigas sem querer mandar tanto em você?” (reduzir o poder da criança “mandona” ampliando o círculo de amizades). Fortalecer a criança para perceber e reagir com assertividade aos sinais de relacionamentos abusivos contribuirá para, poucos anos mais tarde, ela se posicionar diante de exigências abusivas de ciúme e possessividade, disfarçadas de zelo e proteção ( “Eu disse a ele que vou continuar usando as roupas que eu quiser e sem essa de eu dar as senhas das minhas redes sociais”).
Precisamos mesmo cuidar emocionalmente das nossas crianças.
Com certeza! E também dos adultos que delas cuidam!