É assim que Antônio, com tristeza, finaliza seu relato sobre as dificuldades que se acumulam em seu casamento de oito anos com Kelly.
“No início do namoro, estávamos encantados um com o outro. A gente se divertia, gostávamos de fazer caminhadas, ir ao cinema, sair com os amigos. O sexo era ótimo, ela gozava muito, e eu ficava feliz com isso. Nos dois primeiros anos de casados, tudo continuava tão bem que decidimos ter um filho. Depois que Gustavo nasceu, ela achou melhor parar de trabalhar para cuidar dele, e eu concordei. Mas, por conta disso, precisei aumentar minha carga de trabalho. E aí os problemas começaram: reclamações, cobranças, insatisfação crescente. Até que chegamos a esse ponto: nada do que eu faço está bom. Confesso que não sou santo: acabo perdendo a paciência. Também reclamo de muitas coisas que ela faz e o clima da relação fica péssimo. E aí o sexo, como ela gosta de dizer, “nem pensar”!
Na letra de Grito de alerta, Gonzaguinha sintetiza esse processo:
São tantas coisinhas miúdas, roendo, comendo, arrasando aos poucos o nosso ideal
São frases perdidas, num mundo de gritos e gestos, num jogo de culpas que faz tanto mal
De tantas escolhas possíveis, o que Antônio achou encantador em Kelly e vice-versa? Quais as possibilidades de redescobrir esse encantamento? Como cada um contribuiu para o problema e o que cada um poderia fazer para reconstruir uma boa relação?
O jogo de culpar o outro e imaginá-lo como causa da própria insatisfação nos impede de perceber como contribuímos para agravar as dificuldades e o que podemos oferecer de bom para melhorar a qualidade do relacionamento. É mais fácil dizer o que o outro precisa fazer do que refletir sobre o que precisamos mudar em nós mesmos. Quando agimos assim, deixamos de utilizar um poderoso instrumento de transformação: mudar nossa própria postura para modificar o circuito interativo. E, então, escolher o rumo a seguir.
É, na maioria das vezes é fácil culpar o companheiro, esquecendo que uma relação a dois, como o próprio nome já diz, não depende somente de um, mas dos dois parceiros. Creio que se a relação não vai bem, é porque há falhas das duas partes, então cabe aos dois tentar recomeçar, ver os erros, aceitá-los e tentar não repetir os mesmos, caso contrário, o melhor é cada um partir pra sua e viver outra vida.
Pois é, nem sempre o esforço de recompor a relação é bem sucedido. E então outro trabalho é necessário: desvincular-se e seguir novos caminhos, acreditando que o amor é eterno, não necessariamente pela mesma pessoa.