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Com a morte de um ente querido, toda a família precisa fazer o trabalho de luto. (Detalhe da fachada da Igreja da Sagrada Família, que fotografei em Barcelona)

Com a morte de um ente querido, toda a família precisa fazer o trabalho de luto. (Detalhe da fachada da Igreja da Sagrada Família, que fotografei em Barcelona)

– Vovô virou estrelinha – disse Carolina ao comunicar a morte de seu pai para Bruno, seu filho de cinco anos.

– Estrelinha, mamãe?! Vovô morreu, foi para o cemitério e virou zumbi! – retrucou o menino, surpreendendo a mãe.

No trabalho com famílias, é frequente a questão de como abordar o tema da morte com crianças. Uma das perguntas habituais é se devemos “poupar” a criança de ir a velórios e enterros. Lembro-me da minha infância, em que os mortos eram velados nas casas, e as crianças se aproximavam do caixão, tocavam o cadáver com curiosidade e comentavam o que percebiam. E o que é “poupar” as crianças, que presenciam cenas horripilantes de mortes violentas nos noticiários, sem falar nas que vivem em comunidades onde predomina a linguagem da violência, que precisam aprender a se proteger dos tiroteios e se deparam com cadáveres ensanguentados nas ruas?

A morte faz parte da vida, mas falar sobre isso virou tabu. Conheço alguns pais que, preocupados com a morte de um bichinho de estimação, compraram outro “igualzinho” para colocar em casa, antes que o filho retornasse da escola, na esperança de que este não percebesse o que acontecera. Crianças não são bobas, e lidam com a realidade muito melhor do que alguns adultos, como mostrou Bruno para sua mãe.

Com crianças pequenas, podemos falar sobre o ciclo da vida mostrando as flores que desabrocham e depois completam seu tempo. E dizer que o mesmo acontece com os demais seres. Em algum momento, morrerá alguém da família, do círculo de amigos, ou até mesmo colegas de escola. As crianças maiores fazem perguntas difíceis de responder: “Se Deus é tão bom, por que levou minha mãe”? “Meu colega morreu no acidente. Eu também posso morrer”? “Mamãe, se você morrer, quem vai cuidar de mim”? “Eu também quero morrer para encontrar o papai no céu”!

Se a família segue uma religião, poderá rezar pela pessoa que morreu e explicar que nosso corpo é apenas uma embalagem temporária para um espírito que continua a existir. Se não há um referencial de espiritualidade, explicar que a pessoa continua viva em nosso amor e em nossas lembranças. É claro que isso não extingue a tristeza e a saudade pela falta da proximidade física. E vale lembrar que o mais importante é oferecer a escuta acolhedora dos sentimentos e das questões que surgem no decorrer do trabalho de luto que precisará ser feito por toda a família.